A
actual educação estraga as crianças - Eduardo Sá
Foi assim que iniciou a
sua palestra no Colégio de Nossa Senhora do Alto, em Faro, uma iniciativa
promovida em colaboração por aquela instituição e pelo Centro de Formação Ria
Formosa sobre o "Envolvimento Parental na Escola".
Perante um auditório com
cerca de 280 pessoas, o conferencista afirmou que "a estrutura tecnocrática, em
que se transformou a educação, faz mal" e criticou o "furor da formação técnica
e científica" que levou ao esquecimento de que "o melhor do mundo não é a escola
mas as pessoas e, em particular, as relações familiares". Lamentando a ausência
de uma lei de bases para a família e para a criança, Eduardo Sá lembrou que "há
aspectos muito mais importantes do que a escola na vida das crianças", como a
família. "Estamos a criar uma mole de licenciados e de mestres aos 23 anos que
esperamos que sejam ídolos antes dos 30 e o fundamental não é isso", lastimou,
lembrando que "estamos a exigir aos nossos filhos que sejam iguais a nós: que
ponham o trabalho à frente de tudo o resto", esquecendo-nos de brincar com
eles.
O conferencista considerou que "criámos uma ideia absurda de
desenvolvimento" e lembrou que "a vida não acaba aos 17 anos com a entrada no
ensino superior". "Só os alunos que tiveram pelo menos uma negativa no seu
percurso educativo é que deviam entrar no ensino superior porque estamos a criar
uma geração de pessoas imunodeprimidas", defendeu, sustentando que "errar é
aprender".
Eduardo Sá disse achar "uma estupidez" crermos que
tecnocratas sejam "sempre mais inteligentes porque dominam a estatística",
"inacreditável" que "o mundo, hoje, privilegie o número à palavra" e um
"escândalo" que, "nesta sociedade do conhecimento, não perguntemos até que ponto
é que mais conhecimento representou mais humanidade". "Este mundo está
felizmente a morrer de morte natural. O futuro vão voltar a ser as pessoas",
congratulou-se, considerando a actual crise uma "oportunidade fantástica que
temos a sorte de estar a viver". "Esta crise representa o fim de um ciclo que
aplaudo de pé. Este furor positivista está felizmente a morrer", complementou,
considerando que "o custo do positivismo foi a burocracia e a tecnocracia"."Acho
óptimo que possamos reabilitar algumas noções que parecem ferir os tecnocratas e
que são preciosas para a natureza humana. Acho inacreditável que, depois do
positivismo, a fé tenha passado de moda porque a fé é uma experiência de
comunhão entre as pessoas", acrescentou.
Eduardo Sá defendeu que as
"educações tecnológicas" possam dar lugar à "educação para o amor" como "a
questão mais importante das nossas vidas". "Acho fundamental que tenhamos a
coragem, a ousadia e a verticalidade de dizer que a maior parte das pessoas se
sente mal-amada e acho fundamental explicar aos nossos filhos que é mentira que
acertemos no amor à primeira e que é notável aquilo que se passa dentro do nosso
coração", afirmou.
Neste sentido afirmou que "devia ser proibido
dizermos aos nossos filhos que se deve casar para sempre". "Sempre que namoramos
mais um bocadinho, casamo-nos mais um pouco e sempre que deixamos de namorar,
divorciamo-nos em suaves prestações", concretizou a provocação, considerando o
casamento tão sagrado como frágil. "É uma experiência sagrada porque duas
pessoas que decidem comungar-se é uma experiência tão preciosa que é sagrada,
mas é frágil porque, às vezes, os pais estão tão preocupados com a educação dos
filhos que se esquecem de namorar todos os dias", lamentou, lembrando que "pais
mal-amados tornam-se piores pais". "É fundamental que a relação amorosa dos pais
esteja em primeiro lugar, antes da relação dos pais com as crianças",
sustentou.
Eduardo Sá defendeu que "as crianças devem sair o mais tarde
possível de casa" e jardins de infância "tendencialmente gratuitos para todos".
"Não se compreende como é que a educação infantil e o ensino obrigatório não são
a mesma coisa", criticou, lamentando que os governantes, "nomeadamente a
propósito da crise da natalidade", não perguntem: "quanto é que uma família da
classe média (se é que isso ainda existe em Portugal) precisa de ganhar para ter
dois ou três filhos num jardim de infância".
O psicólogo defendeu ainda
jardins de infância onde as crianças "brinquem e ouçam e contem histórias",
tenham educação física, educação musical e educação visual. "O ensino básico não
é muito importante senão para que, para além de tudo isto, as crianças tenham
português e matemática", disse, considerando ser "mentira que as crianças não
tenham competências para a aprendizagem da matemática". "É óptimo brincar com a
matemática mas a matemática sem o português torna-nos estúpidos. Não consigo
entender que este país não acarinhe a língua materna", criticou.
Eduardo
Sá disse ainda não achar que "mais escola seja melhor escola", criticando os
blocos de aulas de 90 minutos porque aulas expositivas daquela duração são
"amigas dos défices de atenção". "Acho um escândalo que as crianças comecem a
trabalhar às 8h, terminem às 20h e que tenham, entre blocos de 90 minutos, 10
minutos de intervalo. Quanto mais as crianças puderem brincar, mais sucesso
escolar têm", defendeu, acrescentando que "os pais estão autorizados a ser
vaidosos com os filhos mas proibidos de querer a criar jovens tecnocratas de
fraldas". "Devia ser proibido que as crianças saíssem do jardim de infância a
saber ler e escrever", advertiu.
A terminar, defendeu ser possível "ter
sucesso escolar" e "gostar da escola". "Tenho esperança que um dia as crianças
queiram fugir para a escola", concluiu.
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